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Operações de aumento de capital com recurso a créditos adquiridos abaixo do par

No mês passado, foi disponibilizada no site do Portal das Finanças a ficha doutrinária emitida no âmbito do processo n.º 2017 002453/PIV 12385, sancionado por Despacho da Subdiretora-Geral do Imposto sobre o Rendimento e da Relações Internacionais, de 29 de maio de 2019, relativa ao tratamento fiscal a conferir à utilização dos créditos adquiridos abaixo do seu valor nominal, para realizar capital social, cobrir prejuízos e converter em prestações acessórias na sociedade devedora.

De acordo com esta ficha, o direito subjacente à aquisição de créditos abaixo do par, numa perspetiva contabilística, deve ser registado na esfera da sociedade investidora pelo respetivo custo de aquisição (i.e., abaixo do seu valor nominal). Assim, uma vez que uma operação de conversão de créditos em capital social implica a troca de um ativo financeiro por outro (direito de crédito por participação financeira), há lugar ao apuramento de um ganho, caso o novo ativo (capital social da sociedade participada) seja registado pelo valor nominal do crédito.

O mesmo sucede com o a conversão de créditos adquiridos abaixo do par em prestações suplementares / acessórias, pelo valor nominal.

Em qualquer um destes casos, o entendimento propugnado pela AT vai no sentido de considerar que o ganho realizado assume a natureza de uma mais-valia sujeita a tributação, em sede de IRC, no momento da conversão do crédito. Este entendimento vem, contudo, contrariar uma posição antiga da AT sobre a mesma matéria, segundo a qual a mais-valia gerada neste tipo de operações assume uma natureza meramente potencial, apenas se tornando efetiva – e, por isso, sujeita a tributação em IRC – aquando da eventual alienação da participação de capital ou do reembolso das prestações suplementares / acessórias (ou de qualquer outra operação que implique a extinção destes instrumentos de capital próprio).

Antagonicamente, segundo o mesmo entendimento recentemente emitido pela AT, a conversão de créditos adquiridos abaixo do par para cobertura de prejuízos da sociedade participada origina um ganho que apenas será tributado, ao nível da sociedade participante, no momento da alienação da participação ou da sua liquidação e partilha aos sócios. Esta posição é sustentada pelo disposto na alínea a) do n.º 8 do artigo 46.º do Código do IRC, segundo o qual “(…) no valor de aquisição das partes de capital devem considerar-se, consoante os casos, positiva ou negativamente (…) O montante das entregas dos sócios para cobertura de prejuízos, o qual é imputado proporcionalmente a cada uma das partes de capital detidas”.

Sucede que não se compreende a distinção de tratamento conferido a realidades tão similares: a conversão de créditos para (i) aumento de capital social ou em prestações suplementares / acessórias vs. (ii) para cobertura de prejuízos.

De facto, em substância, qualquer uma destas operações tem como finalidade o reforço dos capital próprio da Empresa participada, não se verificando em nenhuma destas circunstâncias a realização efetiva de qualquer mais-valia, mas antes de um ganho meramente potencial ou latente – realizável apenas aquando da alienação da participação ou da sua liquidação e partilha aos sócios ou, no caso das prestações suplementares / acessórias, no momento do recebimento do direito de crédito.

Ao que parece, avizinham-se assim novos processos de contencioso tributário futuro entre os contribuintes e a AT a propósito desta matéria. Talvez se esta temática tivesse um respaldo legal expressamente consagrado no Código do IRC se pudessem dissipar, de vez, todas as dúvidas subjacentes.

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