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A discricionariedade das Câmaras Municipais na aplicação dos benefícios fiscais à reabilitação urbana

As condições para aplicação dos benefícios fiscais previstos para imóveis objeto de reabilitação urbana encontram-se, em linhas gerais, consignadas na lei, com especial enfoque no artigo 45.º do Estatuto dos Benefício Fiscais (EBF), no que respeita aos benefícios em sede de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) e de Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), e na verba 2.23 da Lista I anexa ao Código do Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA) para aplicação da taxa reduzida de IVA.

Não obstante, as referidas disposições normativas pouco ou nada preveem relativamente ao procedimento prático para aplicação destes benefícios fiscais. Neste contexto, a experiência prática tem-nos ditado que esta insuficiência de regulamentação deixa um indesejável espaço para a existência de discricionariedade das Câmaras Municipais na condução destes procedimentos, enquanto entidades competentes para atestar o cumprimento de grande parte dos requisitos legalmente previstos para este efeito.

Vejamos alguns exemplos com base no caso das duas maiores Câmaras Municipais do país. Desde logo, na medida em que a lei não prevê qual o facto determinante para aplicação no tempo da redação do artigo 45.º do EBF, publicada pela Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, com entrada em vigor no dia 1 de janeiro de 2018 (lei nova), tal lacuna permite que as referidas Câmaras Municipais adotem a seguinte posição (divergente) a este respeito: (i) enquanto que a Câmara Municipal de Lisboa (CML) prevê expressamente que a lei nova deverá aplicar-se às aquisições de imóveis que ocorram após 1 de janeiro de 2018 e cujas obras tenham sido iniciadas após esta data; (ii) já a Câmara Municipal do Porto (CMP) determina que a lei nova se aplique a obras concluídas ou a prédios adquiridos a partir de 1 de janeiro de 2018.

Adicionalmente, refira-se que a lei nova veio acrescentar no artigo 45.º do EBF a necessidade de o pedido de vistoria inicial ser requerido conjuntamente com a comunicação prévia ou com o pedido de licença da operação urbanística. Esta condição vem regulada no formulário para aplicação dos benefícios fiscais da CML, enquanto que no formulário criado pela CMP não existe qualquer menção.

Esta diferença de posições é também encontrada na seleção dos documentos a anexar ao formulário para aplicação dos benefícios fiscais. Veja-se, por exemplo, que, para comprovação do cumprimento dos requisitos de eficiência energética e de qualidade térmica, a CML exige a anexação ao seu formulário de vistoria final de um termo de responsabilidade assinado por perito qualificado, enquanto que no formulário paralelo criado pela CMP impõe-se apenas que o requerente junte um certificado que ateste o cumprimento deste requisito.

Cumpre ainda referir que a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) tendo vindo a impor condições adicionais de comprovação formal do cumprimento dos requisitos para aplicação da taxa reduzida do IVA às empreitadas de reabilitação urbana. Em particular, a AT tem vindo a exigir a apresentação de uma declaração emitida pela Câmara Municipal de localização do imóvel no sentido de atestar que a intervenção projetada consubstancia uma empreitada de reabilitação urbana. Nos termos da informação que nos foi disponibilizada, a CML e a CMP têm atuado de forma não coordenada, tanto na posição quanto à criação da minuta da referida declaração, como na interpretação do conceito de reabilitação urbana.      

Em face dos exemplos apresentados, cumpre constatar que a excessiva discricionariedade das Câmaras Municipais na gestão dos procedimentos para aplicação dos benefícios fiscais em apreço reveste os mesmos de complexidade e morosidade adicionais e de uma indesejável insegurança jurídica. Perante o exposto, é nosso entendimento que a regulamentação destes procedimentos a aplicar por todas as Câmaras Municipais, tendo em vista a sua uniformização, promoveria a simplificação da aplicação dos benefícios fiscais à reabilitação urbana, constituindo ainda um incentivo ao investimento imobiliário em Portugal.           

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