Opinião

Diminuição da taxa geral de IRC… A que preço?

A extinção do SIFIDE indireto permitirá reduzir impostos, mas levanta questões sobre futuras revisões dos benefícios fiscais em sede de IRC.

No seguimento da recomendação efetuada pela Unidade Técnica de Avaliação de Políticas Tributárias e Aduaneiras (U-Tax), no seu relatório de junho de 2025, com vista à avaliação dos benefícios fiscais existentes, o Governo aprovou, em Conselho de Ministros, no passado dia 13 de novembro, uma Proposta de Lei que visa rever o regime do Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial II (SIFIDE).

Esta proposta, que prorroga o chamado SIFIDE direto até 2026 e extingue, para o futuro, o SIFIDE indireto (ou seja, o crédito fiscal resultante da participação no capital de instituições de I&D e de contribuições para fundos de investimento que realizem investimentos de capital próprio e de quase-capital), surge como resposta às ineficácias do mecanismo, nomeadamente, no caso concreto do SIFIDE indireto, que têm vindo a ser identificadas ao longo dos últimos anos.

A título de exemplo, de acordo com o referido relatório, o SIFIDE indireto representou, em 2022, 49,8% da despesa total do SIFIDE, contudo, há evidência de que uma parte significativa do investimento permanece retida nos fundos e empresas-alvo, sem aplicação efetiva em atividades de I&D.

Note-se que o SIFIDE, crédito fiscal destinado a incentivar o investimento empresarial em I&D, é a maior despesa fiscal em sede de IRC, totalizando €875,5M em 2024. Não obstante, apesar das ineficácias do mecanismo, a U-Tax concluiu que este impulsiona de forma significativa o investimento, o número de trabalhadores afetos a I&D, a produtividade e eficiência. Segundo a U-Tax, para cada €1 que o Estado abdica em receita fiscal com o SIFIDE, são realizados, em média, €1,72 em investimentos adicionais em I&D, dos quais €1,49 pela própria empresa. Estes resultados confirmam a relevância do SIFIDE para o aumento do investimento em I&D das empresas, contribuindo, consequentemente, para o desenvolvimento e crescimento do tecido empresarial português.

Neste contexto, a referida proposta do governo prorrogou parcialmente o incentivo até ao final de 2026 e introduziu alterações significativas, nomeadamente a não prorrogação da possibilidade de aplicação indireta do SIFIDE através de fundos de investimento, que, de acordo com o relatório do Orçamento do Estado (OE) para 2026, poderá implicar uma redução de €124,2M na despesa fiscal associada já em 2026 e de €689,6M de 2027 a 2030.

Esta redução na despesa fiscal permitirá, conforme transmitido pelo Ministro da Presidência, António Leitão Amaro, aquando do comunicado do Conselho de Ministros de 13 de novembro de 2025, reduzir impostos, nomeadamente em sede de IRS e IRC. Aliás, de acordo com o mesmo, uma das maneiras de baixar impostos é eliminar benefícios fiscais que são improdutivos, desadequados e que foram desaconselhados pela avaliação técnica.

A posição do Governo é, portanto, clara, e está alinhada com a Proposta de Lei do OE para 2026, a qual se encontra principalmente focada no alívio da tributação das pessoas singulares e coletivas e escassa na introdução de medidas de apoio direto ao emprego e ao investimento das empresas. Neste plano, a revisão do modelo do SIFIDE, ainda que permita reforçar a eficácia e valorizar a investigação e desenvolvimento empresarial, representa, essencialmente, uma estratégia de racionalização da despesa fiscal que poderá não contribuir para um aumento do investimento das empresas.

Posto isto, ao invés de um aumento dos incentivos fiscais ao investimento, o Governo promove uma estratégia de redução gradual e sustentável da carga fiscal. Na sua exposição de motivos, a redução da taxa de IRC propicia um ambiente mais favorável ao crescimento económico, potenciando e aumentando a capacidade de investimento das empresas.

Neste contexto, na medida em que o Governo defende que uma das maneiras de baixar impostos é eliminar benefícios fiscais que foram desaconselhados pela U-Tax, estará a política fiscal de redução gradual de um ponto percentual por ano da taxa geral de IRC (atualmente fixada em 20%) para 17% a partir de 2028, a iniciar-se em 2026, a prever novas revisões nos benefícios fiscais existentes? Será, portanto, expectável uma revisão anual aos benefícios fiscais para acompanhar a redução gradual da taxa de IRC?

Recorde-se que a redução da taxa de IRC terá, de acordo com o Ministério das Finanças, um impacto orçamental de €300M por ano, montante esse bastante superior à redução da despesa fiscal associada ao SIFIDE indireto.

Caso seja esse o caminho do Governo, importa destacar as seguintes recomendações efetuadas pela U-Tax, no seu relatório de junho de 2025, com impacto ao nível do IRC:

  • Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI): redução do atual limite de dedução de €15M, de forma a reduzir assimetrias nas deduções fiscais;
  • Deduções Relativas a Donativos Empresariais: redução ou eliminação da majoração associada aos donativos em espécie.

Adicionalmente, para além dos aspetos destacados pela U-Tax, é também importante salientar, da nossa experiência prática, a elevada litigância que a aplicação prática do RFAI tem vindo a suscitar, com interpretações restritivas do regime por parte da Autoridade Tributária em atos de inspeção e que colocam, muitas vezes, em causa os benefícios fiscais apurados pelas empresas.

Em suma, se por um lado vemos com bons olhos as medidas apresentadas pelo Governo (nomeadamente a redução da taxa de IRC), por outro, sabemos que são ainda necessárias medidas estruturantes de apoio às empresas, que promovam, de forma direta, o investimento. Aliás, nos últimos dias temos assistido a algumas afirmações por parte do tecido empresarial em que reivindicam um aumento dos incentivos fiscais ao investimento, ao invés da redução da taxa do IRC.

Neste sentido, sem prejuízo de virem a ser consideradas as recomendações efetuadas pela U-Tax, parece-nos que uma política pública, exclusivamente focada na despesa corrente e permanente do estado poderá ser prejudicial para o investimento, afirmando-se importante a introdução de medidas de incentivo ao mesmo.