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Trabalho remoto para o estrangeiro - Obrigações fiscais e parafiscais em Portugal

A pandemia da COVID-19 reinventou a forma de trabalhar das organizações, abrindo a porta à normalização de conceitos como o trabalho remoto. Quais as obrigações fiscais e parafiscais decorrentes desta nova realidade?

A pandemia da COVID-19 veio revolucionar o dia-a-dia das organizações com a transição repentina do trabalho presencial para o trabalho remoto, sendo que tal efeito se estendeu ao campo dos impostos diretos, nomeadamente em sede de IRS, na esfera dos colaboradores. Questionamo-nos agora como se passa a determinar a residência fiscal dos colaboradores que trabalham remotamente em Portugal para uma empresa estrangeira; onde é que a tributação deve ser efetivada; se um colaborador em situação de trabalho remoto deve pagar contribuições para a Segurança Social em Portugal ou no estrangeiro, entre outras questões que pretendemos comentar e esclarecer ao longo deste artigo.

No que à residência fiscal diz respeito, entendemos que a lei doméstica portuguesa é clara ao elencar os critérios relevantes para determinar a residência fiscal. Entre outros critérios, são considerados residentes fiscais em Portugal as pessoas singulares que tenham ficado em território português mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses num ano civil ou, tendo ficado por menos tempo, aí disponham, em qualquer altura do período referido anteriormente, de habitação que façam supor intenção de a manter e ocupar como residência habitual. Em caso de conflito de residência fiscal com outro Estado com o qual Portugal tenha celebrado um Acordo para Evitar a Dupla Tributação (“ADT”), importa verificar as regras de  desempate (“tie-break”) da residência, sendo uma das mais comuns o critério do centro de interesses vitais do sujeito passivo.

Durante o período de restrições de pandemia da COVID-19, as orientações da OCDE proferidas em janeiro de 2021 sobre o impacto da pandemia Covid-19 nos ADTs, eram as de que se, no contexto de, e em resultado da pandemia, a presença temporária de uma pessoa singular numa jurisdição pudesse conduzir a um conflito de residência, seria pouco provável que, de acordo com os critérios de desempate (tie-breaker)dos ADTs a residência fiscal dessa pessoa fosse alterada, dado que o facto de a mesma não poder regressar ao país de origem em virtude das regras sanitárias em vigor, não deveria ter influência na determinação da sua residência fiscal (de notar, contudo, que a Autoridade Tributária Portuguesa não se manifestou sobre o tema).

E após o período pandémico? Neste caso, considera a OCDE que tal abordagem poderia ser distinta caso a alteração nas circunstâncias permanecesse mesmo após o levantamento das restrições da pandemia. Cada caso terá de ser analisado casuisticamente e a interpretação passará quer pelas regras domésticas quer pelo ADT celebrado entre Portugal (caso exista) e o outro país. No entanto, podemos adiantar que ao trabalhar durante o ano/grande parte do ano remotamente em Portugal, e sendo os laços familiares, profissionais e económicos mais fortes com o território português, a maior probabilidade é que o sujeito passivo seja considerado residente fiscal em Portugal.

Analisada a residência fiscal do sujeito passivo, é necessário verificar se este se encontra sujeito a tributação em Portugal, e em que medida, e se existe obrigação declarativa em sede de IRS em Portugal. Também relativamente a este tema, o Código do IRS é claro: os não residentes fiscais serão tributados apenas sobre os rendimentos de fonte portuguesa enquanto os residentes fiscais serão tributados sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora do território Português.

Neste sentido, é importante referir que, de acordo com o disposto no artigo 18.º do Código do IRS, se consideram obtidos em Portugal, entre outros, os rendimentos do trabalho dependente resultantes de atividades exercidas em território português, o que inclui o trabalho remoto em Portugal, ainda que prestado para uma entidade estrangeira e pago fora de Portugal. Cabe ainda referir que, caso a pessoa singular seja não residente fiscal em Portugal, é importante analisar as regras do ADT para verificar se Portugal tem direito a tributar tal rendimento pago por entidade estrangeira, ainda que seja considerado de fonte portuguesa.

Para além dos impactos em sede de IRS, o Sujeito Passivo pode ficar sujeito a contribuições para a Segurança Social portuguesa uma vez que, regra geral, o indivíduo está sujeito à Segurança Social caso trabalhe em território português ainda que remotamente para o estrangeiro. De notar que, caso haja Convenção sobre Segurança Social ou outro instrumento internacional que regule as relações de Segurança Social entre Portugal e o outro país, haverá que averiguar se poderá haver dispensa de contribuições no Estado onde o trabalho é prestado, mediante determinadas condições. Caso sejam devidas contribuições para a Segurança Social em Portugal, a entidade não residente poderá ter de se registar em Portugal para efeitos de Segurança Social para proceder à entrega das respetivas contribuições.

Por fim, importa referir que o trabalho remoto pode ainda gerar riscos de estabelecimento estável para o empregador, sendo que esse tema deve igualmente ser analisado ao abrigo das regras domésticas e do ADT entre Portugal e o outro país (se aplicável).

Em suma, podemos concluir que o trabalho remoto veio tornar ainda mais complexa a interpretação das normas fiscais e parafiscais no que à tributação dos rendimentos diz respeito.  Dada à nova realidade da forma de trabalho, é possível que mais tarde ou mais cedo as regras sejam revistas e adaptadas, no entanto, até este momento é importante que o sujeito passivo esteja atento às suas obrigações fiscais e parafiscais em Portugal de acordo com o seu caso em específico.

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