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Prejuízos Fiscais no Orçamento do Estado para 2023 – Presente envenenado?

A Proposta de Lei para o Orçamento do Estado para 2023 introduz diversas alterações ao atual regime de dedução e transmissão de prejuízos fiscais, que se apresentam como vantajosas e simplificadoras para as empresas. Contudo, serão estas efetivamente medidas favoráveis ou estaremos perante uma nova situação de incerteza no que toca à utilização dos prejuízos fiscais pelas empresas?

A lei fiscal atualmente em vigor prevê um prazo para reporte de prejuízos fiscais de 12 anos para as micro, pequenas e médias empresas e de 5 anos para o restante tecido empresarial. Adicionalmente, prevê-se que a dedução a efetuar em cada um dos períodos de tributação não pode exceder o montante correspondente a 70% do lucro tributável da empresa nesse ano (80% no caso específico da utilização dos prejuízos fiscais gerados em 2020 e 2021).

Adicionalmente, sempre que se verifique uma alteração da titularidade de mais de 50% do capital social ou da maioria dos direitos de voto da empresa, a possibilidade de reporte e posterior utilização dos prejuízos fiscais encontra-se condicionada a autorização pelo membro do Governo responsável pela área das finanças, em casos de reconhecido interesse económico e mediante requerimento a apresentar à Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”).

A Proposta de Lei para o Orçamento do Estado para 2023 (“PL OE 2023), introduz diversas alterações relevantes a este regime.

Entre outras, prevê a eliminação do limite temporal para reporte e utilização dos prejuízos fiscais, à semelhança do que já acontece em alguns países europeus. Esta alteração visa não só os prejuízos gerados a partir de 1 de janeiro de 2023, mas também aqueles que tenham sido gerados em exercícios anteriores e que ainda se encontrem disponíveis para dedução a essa data. Por outro lado, prevê-se que o limite para dedução anual dos prejuízos fiscais passe de 70% para 65% do lucro tributável gerado pela Empresa.

Ou seja, olhando a este primeiro conjunto de alterações, destaca-se claramente como uma medida positiva a possibilidade de utilizar os prejuízos fiscais sem limite temporal (apesar do aspeto negativo e penalizador do inferior limite de utilização anual). Esta medida poderá ser muito relevante para as empresas que nos últimos exercícios sofreram impactos negativos na sua atividade, gerando assim prejuízos e vendo-se impossibilitadas de utilizar prejuízos de anos anteriores. Por outro lado, pode ser igualmente relevante para empresas mais pequenas ou que, pela natureza da sua atividade, tipicamente não conseguem gerar lucros tributáveis num período temporal de curto ou médio prazo.

No que toca à possibilidade de reporte e utilização de prejuízos fiscais quando se verifiquem alterações superiores a 50% da titularidade do capital das empresas, a PL OE 2023 vem eliminar a necessidade de solicitar autorização ao membro do Governo responsável pela área das finanças para manutenção dos prejuízos gerados em exercícios anteriores e ainda disponíveis para dedução. Mantém-se assim o direito à dedução dos prejuízos fiscais, bastando que se conclua que a operação não teve como principal objetivo, ou como um dos principais objetivos, a evasão fiscal, o que pode considerar-se verificado, nomeadamente, nos casos em que a operação tenha sido realizada por razões económicas válidas.

Esta parece-nos a alteração mais controversa introduzida pela PL OE 2023 e relacionada com o regime dos prejuízos fiscais. A atual obrigação de apresentar um requerimento para manutenção dos prejuízos fiscais apresentava-se frequentemente como dissuasora do reporte futuro e valorização dos prejuízos, por exemplo no contexto de uma transação, na medida em que representava não só uma carga burocrática adicional, mas também porque o requerimento a apresentar tinha requisitos específicos muitas vezes difíceis de demonstrar, e tinha ainda como consequência a abertura de um procedimento inspetivo por parte da AT. Por outro lado, a apresentação deste requerimento permitia também uma resposta exata por parte da AT sobre a possibilidade de reporte e utilização dos prejuízos visados que, positiva ou negativa, se traduzia numa decisão clara e numa segurança adicional por parte das empresas na futura utilização dos seus prejuízos.

A redação dada pela PL OE 2023 levanta dúvidas, na medida em que não é claro como se define ou pode ser feita a prova de que a “operação não teve como principal objetivo, ou como um dos principais objetivos, a evasão fiscal” ou que a mesma foi “realizada por razões económicas válidas”. Por outro lado, eliminando-se a limitação temporal para reporte e utilização dos prejuízos, estas alterações terão como consequência que a AT, que no contexto de uma inspeção pode corrigir não só o exercício sobre o qual a mesma versa, mas também aquele em que foram gerados os prejuízos que estão a ser deduzidos nesse exercício, possa realizar correções a um horizonte temporal passado muito mais alargado do que aquele a que estamos hoje habituados.

Posto isto, e antevendo-se a aprovação da PL OE 2023, fica a esperança de clarificações futuras que esclareçam estas dúvidas e, esperemos, permitam uma maior segurança aos contribuintes.

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