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O Futuro da Tributação: Princípio do Destino (Serão Indiretos todos os Impostos sobre o Rendimento Empresarial num futuro próximo?)

O direito fiscal internacional assenta historicamente a fundamentação para as suas regras no princípio da origem. Nesse quadro geral, todo o edifício da tributação do rendimento pessoal individual e das pessoas coletivas foi assente na lógica da residência.

A sua lógica era imbatível: os agentes económicos usufruem de utilidades públicas prestadas nas suas localizações originárias, sendo estas as detentoras de toda a informação que permitiria uma tributação de acordo com o princípio do acréscimo, concretizando a tributação do rendimento real (no caso das pessoas singulares) e do lucro real (no caso das pessoas coletivas).

Esta lógica era reforçada pela envolvente estrutural. No caso da tributação singular, as ponderações pessoais deveriam ser efetuadas de acordo com as condições do seu agregado familiar, que se situaria inevitavelmente numa localização de residência. Por sua vez, no caso da tributação das pessoas coletivas, a atribuição do direito de tributar à localização da sede (ou da direção efetiva) decorria igualmente de uma “compensação” pelo prejuízo que esse Estado havia suportado, permitindo a realização de investimentos das “suas” empresas em outras jurisdições o que, alegadamente, afetaria o crescimento económico no seu território (princípio da neutralidade na exportação de capitais, que prejudica atribuição do direito de tributar ao Estado da Fonte dos rendimentos).

Todo este edifício formal, que assenta numa lógica estrita de soberania fiscal enclausurada, tem sido colocado em causa pelo movimento de globalização, recentemente acelerado pela digitalização da economia. As pessoas circulam livremente num mundo cada vez mais global, e as empresas (pessoas jurídicas eminentemente formais) estabelecem-se de forma ainda mais facilitada nas jurisdições que lhes são mais convenientes. Quanto a isto, a iniciativa BEPS, ao esticar de forma quase insuportável os vetustos conceitos tradicionais, não se traduz senão num mero paliativo temporário que culminará inevitavelmente numa recomposição dos modelos gerais de tributação internacional.

E, neste contexto, o princípio do destino parece adquirir vantagem. Efetivamente, os argumentos que fundamentavam a hegemonia do princípio da origem deixaram de existir. A informação sobre a situação concreta dos contribuintes pode ser angariada e transmitida em rede para todas as Administrações Fiscais (o que já ocorre hoje de forma crescente) permitindo que qualquer jurisdição possa efetuar as ponderações personalizantes necessárias. Por sua vez, a luta contra o planeamento fiscal agressivo só terá sucesso quando as regras de definição do direito de tributar forem alteradas, privilegiando a atribuição desse direito à localização de variáveis mais imóveis para a formação do rendimento. Na lógica do princípio do destino, as decisões empresariais relativas às estratégias de investimento, de tipo de rendimento ou de estruturas de financiamento passariam a ser fiscalmente neutras.

A proposta da Comissão Europeia relativa ao CC(C)TB, que assenta nos critérios de volume de ativos, trabalhadores e vendas é um primeiro indicador dessa nova tendência. A crescente aplicação do princípio da tributação territorial em jurisdições como Hong Kong (ou mesmo Portugal, no caso do regime dos residentes não habituais) é uma outra manifestação. No mesmo sentido, os novos impostos sobre as plataformas digitais assentam igualmente no princípio do destino, contornando de forma “bárbara” os modelos tradicionais de tributação do rendimento, originando duplas tributações económicas ineficientes.

Ora, no limite, poderá dizer-se que, num mundo digital, onde a base de ativos é tendencialmente imaterial e a força laboral assente em modelos de colaboração relativamente informal, em parceria, ou em sociedade, a única variável que resta para a determinação do direito a tributar será o ato de venda (na lógica da oferta) ou o ato do consumo (na ótica da procura). E tal é intrinsecamente verdadeiro: todo o lucro, mesmo na perspetiva conceptual tradicional, tem subjacente um ato, que se consubstancia na transação em mercado. Ora, uma vez que o movimento de digitalização assenta essencialmente na “devolução do poder de mercado” ao consumidor, será na localização do cliente que o direito de tributar definitivamente se localizará. Ora, neste quadro, a convergência entre esta nova tributação do rendimento e o IVA é evidente e incontornável, tendo sido já elaboradas propostas de impostos sobre o rendimento das sociedades traduzidas na tributação do cash-flow na jurisdição de destino.

Este modelo (ou um outro qualquer de base similar) terá a virtude de contribuir positivamente não só para a eficiência económica como para a redistribuição global, uma vez que permitirá que as nações mais populosas e, consequentemente, com maior necessidade de infraestruturação reforcem a sua base de tributação.

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