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Manda quem pode, obedece quem deve?

Nos últimos tempos temos assistido a uma série de abordagens distintas quer da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), quer dos próprios Tribunais, relativamente ao conceito de locação de bens imóveis e o seu enquadramento, em sede de IVA.

Para efeitos de IVA, a locação de bens imóveis é uma prestação de serviços que, regra geral, será isenta de imposto. Não obstante, encontram-se expressamente excluídas do âmbito da isenção “a locação de máquinas e outros equipamentos de instalação fixa, bem como qualquer outra locação de bens imóveis de que resulte a transferência onerosa da exploração de estabelecimento comercial ou industrial”.

Sobre esta matéria, a posição da AT tem variado ao longo dos tempos, mas atualmente poderá resumir-se nos seguintes pontos:

  1. i) Haverá que distinguir as situações de locação de imóvel “paredes nuas” – mero arrendamento – das demais situações em que esse arrendamento proporciona ao locatário um determinado valor acrescentado;
  2. ii) Só deverá ser isenta de IVA a locação de bens imóveis para fins não habitacionais, ou seja, para fins comerciais, industriais ou agrícolas, quando for efetuada a título de “paredes nuas”;
  3. ii) A fronteira entre um mero arrendamento “paredes nuas”, logo isento de IVA, e outra operação que extravase o conceito de paredes nuas não se limita ao facto de a locação ser ou não acompanhada de bens de equipamento, mobiliário ou utensílios, estando antes intrinsecamente relacionada com a aptidão produtiva do imóvel, ou seja, a sua preparação para o exercício de uma atividade empresarial.

No entanto, a AT tem vindo a adotar uma posição redutora quanto a este último ponto, entendendo que apenas se poderá considerar a locação sujeita a IVA se o locador assumir uma posição ativa na locação e se no contrato estiverem contempladas outras prestações de serviços indissociáveis da utilização dos espaços, independentemente de estes se encontrarem preparados e equipados para o exercício de uma atividade empresarial.

Recentemente, o Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), no âmbito do processo 302/2021-T, entendeu que, no caso de edifícios totalmente preparados para o exercício das respetivas atividades empresariais, o critério das paredes nuas deverá ser afastado.

O referido caso versou sobre a qualificação de um contrato do tipo build-to-suit, um contrato atípico que reúne obrigações e direitos típicos de um contrato de empreitada e de um contrato de locação de imóveis.

Neste tipo de contratos, o locador não se obriga a uma mera disponibilização de um edifício ao locatário, assumindo uma postura meramente passiva - antes assume perante este o encargo de construir um edifício e de o equipar, satisfazendo todas as pretensões do seu cliente e de forma a este poder iniciar a sua atividade sem quaisquer alterações ao edifício.

Os serviços de construção efetuados pelo locador não são meramente acessórios, não só porque constituem um fim em si mesmo, isto é, correspondem a uma prestação principal pretendida pelas partes, mas também porque têm um valor económico muito substancial

Está-se, assim, perante uma operação que gera um considerável valor acrescentado, que não tem qualquer semelhança com a mera colocação passiva de um imóvel no mercado de arrendamento e em que o elemento preponderante do contrato é a sua construção e equipamento de forma a satisfazer as necessidades do cliente.

Atendendo à crescente sofisticação do setor imobiliário, com a inerente exigência acrescida de complexidade no plano da qualificação jurídica, o problema continua a ser o mesmo: quando a AT “bater” à porta do locador, a resposta à pergunta é sujeito ou isento de IVA? será cada vez mais uma surpresa.

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