Skip to main content

Lucros caídos do céu?

Na sequência do contexto macroeconómico em que nos encontramos, com os preços do gás e eletricidade a atingirem valores recorde e com a inflação em níveis elevados, vem aí mais uma contribuição extraordinária?

Foi publicada no passado dia 14 de setembro, pela Comissão Europeia, uma proposta de regulamento do conselho com vista à implementação dos chamados windfall taxes, ou impostos sobre os lucros “caídos do céu”, com a qual se espera que os Estados-membro angariem 140 mil milhões de euros. É, assim, proposta a aplicação de um imposto temporário sobre os lucros extraordinários dos produtores de combustíveis fósseis, por forma a compensar o aumento dos encargos com gás e energia.

A proposta em causa surge num contexto em que os preços do gás e eletricidade atingiram níveis recorde, em resultado da instabilidade que presentemente se vive no leste da Europa. Espera-se que a perturbação no abastecimento de gás russo à UE continue, o que se repercutirá nos preços do gás, impactando os preços da eletricidade e, consequentemente, o nível de inflação.

A este respeito a UE propõe uma resposta rápida e coordenada por forma a atenuar o agravamento os preços aos consumidores, não apenas aos mais vulneráveis mas às empresas e agregados familiares com rendimentos médios. Reconhecendo que os elevados preços da energia geram ganhos financeiros excessivamente elevados, não só para os produtores de eletricidade mas também para as empresas dos setores do petróleo, do gás, do carvão e da refinação, vem a comissão propor que, entre várias medidas, se reduzam temporariamente as receitas dos produtores de eletricidade e se estabeleça temporariamente uma contribuição de solidariedade sobre os lucros excedentários no setor de combustíveis fósseis. Caberá depois aos Estados-membro utilizar as receitas dessa contribuição para criar apoios destinados às famílias e empresas.

Quanto à redução das receitas dos produtores de eletricidade, a mesma prevê o estabelecimento da existência de limites máximos coordenados para as receitas da eletricidade produzida por produtores com custos marginais mais baixos, como as energias renováveis, a energia nuclear e a lenhite (produtores inframarginais). É assim proposto que as receitas de mercado obtidas pelos produtores com a produção de eletricidade a partir destas fontes devem ser limitadas a 180 EUR, no máximo, por MWh de eletricidade produzida.

No que respeita à contribuição de solidariedade o regulamento propõe a sua aplicação ao setor dos combustíveis fósseis. Esta contribuição, de caráter excecional e temporária, visa os lucros excedentários realizados no exercício fiscal de 2022 pelas empresas e estabelecimentos permanentes que operam nos sectores do petróleo, gás, carvão e refinação. Por lucros excedentários entendem-se os lucros tributáveis gerados pelas atividades desenvolvidas por empresas ou estabelecimentos permanentes do setor do petróleo, do gás, do carvão e da refinação, superiores ao correspondente a 20% de aumento em relação à média dos lucros dos três anos fiscais anteriores, sendo aplicada uma taxa que deve ascender a pelo menos 33%, sendo que esta contribuição acrescerá aos impostos e taxas normais aplicáveis com conformidade com a legislação nacional dos Estados-membro.

Neste sentido e apesar de ser destacada pela Comissão a importância da adoção de medidas coerentes em todo o espaço da UE por forma a evitar distorções no mercado interno e nas cadeias de abastecimento, os países têm acolhido estas propostas de forma bastante distinta, sendo que pelo menos Espanha, Polónia e Portugal já mostraram algumas reservas quanto a esta proposta.

Por cá, houve já o veto de diplomas apresentados pelo BE e PAN para a criação de windfall taxes em alguns setores, mas a incerteza permanece. Dada a fragilidade do tecido empresarial português e das famílias, o Estado poderá necessitar de angariar receita fiscal adicional para financiar apoios. Contudo, é importante relembrar que, se por um lado, já temos no nosso quadro legislativo a derrama estadual, a qual incide sobre a parcela do lucro tributável que exceder a importância de 1.500.000 de euros (podendo a taxa ir até 9% no caso de lucros tributáveis que excedam 35 milhões de euros), a verdade é que a aplicação de contribuições extraordinárias ao longo dos anos, as quais foram permanecendo têm sido uma realidade, como a contribuição extraordinária sobre o sector energético (de 2014) ou a contribuição extraordinária sobre a indústria farmacêutica (de 2015).

Assim, conseguirá a Comissão concretizar o seu objetivo de que estas medidas sejam adotadas de modo coordenado e coerente em todo o espaço da União?

Se tem interesse em receber comunicação da EY Portugal (Convites, Newsletters, Estudos, etc), por favor

clique aqui