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Inspetores fiscais sem fronteiras – os super-heróis da tributação internacional

Muito em voga no debate internacional, e ao abrigo do programa do BEPS (Base Erosion & Profit Shifting), estão as questões inerentes à erosão da base tributável e à alocação de receitas e lucros por parte dos grupos multinacionais. Também agora, mais do que nunca, a figura do anti vilão no papel assumido pelos inspetores tributários sem fronteiras vem responder, de forma crescente, ao relativamente encriptado mundo das operações económicas mundiais.

Muito em voga no debate internacional, e ao abrigo do programa do BEPS (Base Erosion & Profit Shifting), estão as questões inerentes à erosão da base tributável e à alocação de receitas e lucros por parte dos grupos multinacionais. Também agora, mais do que nunca, a figura do anti vilão no papel assumido pelos inspetores tributários sem fronteiras vem responder, de forma crescente, ao relativamente encriptado mundo das operações económicas mundiais.

Os inspetores sem fronteiras ou, na sua terminologia original, Tax Inspectors Without Borders “TIWB”, assume-se na génese como um programa conjunto da OCDE (Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Económico) e das Nações Unidas. A ideia original remonta a 2010 em que, à semelhança dos médicos sem fronteiras, também uma força de especialistas e experts em matérias de índole fiscal deveriam ser enviados - com origem em países economicamente desenvolvidos – para países em desenvolvimento. Com base nesta premissa, entre 2015 e 2016 a OCDE e a UNDP (United Nations Development Programme) lançaram uma iniciativa conjunta que visava, como objetivo inicial, concretizar 100 ações em matéria fiscal até 2020.

No seu relatório anual com referência ao período 2017/2018, a OCDE refere que os programas em curso, de ajuda ativa entre partner administration (departamento ou jurisdição do país que partilha o técnico ou o financiamento para a concretização do programa) e host administration (departamento ou instituição que, num país em desenvolvimento, solicita assistência em matéria fiscal, e corresponde ao organismo responsável pelo cálculo e cobrança de impostos), excederam as expectativas iniciais e apresentam taxas de crescimento surpreendentes, sendo os países das regiões de África, da América Latina e das Caraíbas, bem como da Europa do Leste os principais a requerer e a beneficiar de forma abrangente da expertise dos inspetores provenientes de um número cada vez maior de países parceiros. A este título importará salientar a adesão recente da Bélgica, Índia, África do Sul como alguns dos países que se juntaram, enquanto partner administrations, a outros como a França, a Alemanha, a Itália, Quénia, Holanda, Nigéria, Espanha e Reino Unido.

África continua a ser a principal fonte de pedidos em matéria dos programas dos TIWB. Estes, por seu turno, abrangem um largo espectro de matérias técnicas em diversos sectores de indústria, naturalmente em resposta a cada caso particular da host administration. Os programas ativos contemplam, entre outros, a implementação de ações com vista ao apuramento e levantamento de riscos, melhorias nos processos de auditoria/inspeção, e negociação de acordos prévios de preços de transferência. Em concreto, cumpre salientar que as principais ações inspetivas levadas a cabo nestes países têm como referência matérias de preços de transferência e de tributação internacional, nomeadamente ao nível de estabelecimentos estáveis, validação de management e service fees e a avaliação de direitos de propriedade intelectual.

Não é de espantar, por isso, que em paralelo com a ação dos inspetores sem fronteiras – preconizadores, no caso, de auditorias concertadas fora da sua jurisdição matriz – muitos países na região Africana, e em concreto de língua portuguesa, tenham cumulativamente introduzido no seu normativo legislação específica em matéria de preços de transferência, como foi o caso de Angola (em 2014), Cabo Verde (em 2015) e Moçambique (em 2017), o que vem assumir-se, em países com frágeis mecanismos de controlo interno em outras matérias fiscais por si muito mais maduras, como uma problemática adicional no léxico quotidiano dos dois lados das barricadas, ora da máquina fiscal e dos respetivos inspetores, ora do local management de empresas que, a atuar localmente, deixam de poder pensar apenas no seu domínio e esfera de ação locais.

Os programas desenvolvidos apresentam, num relativo curto espaço de tempo, resultados de sucesso altamente quantificáveis, que se traduzem desde 2012 e à data de Abril de 2018, num valor acumulado de receitas fiscais de 414 milhões de dólares, apresentando um crescimento de 136 milhões de dólares por comparação ao anterior período de reporte do Relatório Anual da OCDE (i.e., à data de abril 2017). Como já referido, os casos de maior sucesso são provenientes da região africana, correspondendo a um total de 244 milhões de dólares de receita arrecada, seguida da América Latina e Caraíbas (110,8 milhões de dólares), Ásia (57,4 milhões de US) e Europa do Leste (1,5 milhões de US).

Supletivamente ao propósito da maximização da receita em curtos períodos de tempo, os programas do TIWB visam, numa perspetiva de longo prazo, desenvolver competências técnicas mais diversificas e sustentadas, permitindo melhorar a qualidade das inspeções de auditoria fiscal, melhoria de ferramentas, processos e procedimentos, mudança organizacional, melhoria e adaptação de legislações vazias e, acima de tudo, ajudar a moldar as ações e comportamentos dos contribuintes resultando, por sua vez, num compliance de melhor qualidade.

Os resultados assinalados pelas host administrations são, essencialmente, os seguintes:

Ao nível das competências técnicas:

  • Inspetores com mais autonomia e confiança nos processos de inspeção e na realização de entrevistas aos contribuintes;
  • Ações de formação tailor-made que granjeiam conhecimento nos procedimentos de gestão de risco e de inspeções de preços de transferência;
  • Partilha de conhecimento e aprendizagem peer-to-peer melhorou através de mecanismos de feedback e trabalho em equipa.

Ao nível das ferramentas, procedimentos e processos:

  • Diretivas e manuais desenvolvidos para a estandardização de processos;
  • Regras fiscais em matéria de procedimentos amigáveis e de acordos prévios de preços de transferência;
  • Aumento das inspeções, com sucesso, na temática de preços de transferência.

Ao nível das alterações organizacionais:

  • Estabelecimento de equipas e unidades específicas em matéria de preços de transferência.

Ao nível das alterações comportamentais (pelo sujeito passivo):

  • A solicitação, pelos inspetores, de informação relevante tem contribuído para aumentar a predisposição dos contribuintes em disponibilizar informação aos inspetores.

Em suma, e não obstante o Programa dos TIWB ser corolário, à data, de sucesso quase imediato e garantido de arrecadação de receitas a nível internacional, o seu objetivo último consiste em promover a autonomia e assegurar a sustentabilidade futura destes países num contexto mundial de rápidas transformações e disrupções em que “o que vai ser” passou a “já foi“ em unidades de tempo medidas em “cripto momentos”. Estas implementações pretendem-se robustas, afiguram-se complexas e sofisticadas do ponto de vista conceptual mas, simultaneamente, frágeis do ponto de vista da sua monitorização prática. Os inspetores sem fronteiras abraçam um novo mundo, o da disseminação das suas práticas tributárias e veem, assim, na sua missão de anti vilão, uma solução pelo bem comum que responde, inevitavelmente, às necessidades pragmáticas decorrentes da crescente complexidade fiscal no panorama mundial.

 

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