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Incentivo Fiscal à Valorização Salarial – um real incentivo ou apenas boas intenções?

A Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2023 (PL OE 23) prevê um incentivo fiscal à valorização salarial, cuja aplicação, para além de complexa, poderá ficar aquém das perspetivas do Governo.

A PL OE 2023 prevê estabelecer um incentivo fiscal à valorização salarial, nos termos do qual, os encargos correspondentes a aumentos salariais de trabalhadores com contrato de trabalho por tempo indeterminado, estabelecidos por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho dinâmica, serão considerados em 150% do respetivo montante, contabilizado como custo do exercício para efeitos da determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC e dos sujeitos passivos de IRS com contabilidade organizada.

A medida apresenta-se como forma de combater a desigualdade de rendimentos, excluindo desta medida os sujeitos passivos relativamente aos quais, face ao exercício anterior, se verifique um agravamento do leque salarial entre a maior e menor remuneração fixa dos trabalhadores face ao exercício anterior, e tem como montante máximo de encargos majoráveis, por trabalhador, o correspondente a 4 vezes a Retribuição Mínima Mensal Garantida (“RMMG”).

Deste facto, para efeitos deste incentivo, apenas são considerados os encargos relativos a trabalhadores cuja remuneração tenha aumentado em pelo menos 5,1% (o mesmo referencial utilizado para efeitos de atualização dos escalões de rendimento coletável do IRS) entre o último dia do período de tributação do exercício em causa e o último dia do período de tributação do exercício anterior e, bem assim, os encargos acima da remuneração mínima mensal garantida aplicável no último dia do período de tributação do exercício em causa.

Adicionalmente, desta medida estão ainda excluídos os encargos relativos a trabalhadores que integrem o agregado familiar da entidade patronal, os membros de órgãos sociais do sujeito passivo de IRC e os trabalhadores que detenham direta ou indiretamente uma participação igual ou superior a 50% do capital social ou dos direitos de voto do sujeito passivo de IRC.

Ora, atendendo a que (i) a medida define como “instrumento de regulamentação coletiva de trabalho dinâmica”, a outorga ou renovação de instrumento de regulação coletiva de trabalho concluída há menos de três anos, (ii) que as previsões apontam para um aumento da remuneração mínima mensal garantida de cerca de 7,8% (passando dos atuais € 705 para € 760 em 2023) e que (iii), em Portugal, de acordo com o relatório 'Retribuição Mínima Mensal Garantida 2021', do Gabinete de Estatística e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho, em 2021, cerca de 25% dos trabalhadores recebiam a RMMG, parece, à primeira vista, que o universo de empresas que vão reunir todas as condições necessárias à aplicação deste incentivo poderá ficar aquém das 500 mil empresas referidas pelo Governo.

De facto, importará destacar que, fora da medida ficarão todas as empresas cuja valorização salarial não decorra de instrumento de regulação coletiva de trabalho outorgada ou renovada há menos de três anos.

Ademais, não só a aplicação da medida é bastante complexa de um ponto de vista de controlo administrativo, como o esforço financeiro que muitas empresas em Portugal já terão de acautelar para 2023 em função do aumento da RMMG e consequentes impactos ao nível de contribuições para a Segurança Social, a par do impacto que o aumento da inflação tem produzido ao nível dos gastos operacionais das empresas, poderão desincentivar as empresas a prosseguir com esta valorização salarial promovida pelo Governo, ainda que à mesma possa estar associado um benefício fiscal.   

Veja-se que, mesmo no caso de uma empresa que cumpra todos os requisitos previstos e que, em 2023, aumente os salários dos seus trabalhadores em 150 euros, (i.e. de € 1.000 euros em 2022 para € 1.150 em 2023), aumentará os seus os encargos anuais (considerando apenas salário e contribuições para a Segurança Social) em aproximadamente € 2.599, traduzindo-se o benefício numa dedução adicional ao lucro tributável de cerca de € 1.299 e numa poupança em IRC de € 292 (considerando uma taxa combinada de IRC e derrama municipal de 22,5%). Ou seja, haverá mesmo que confirmar se fará sentido, numa ótica de custo-benefício, utilizar este benefício fiscal. Talvez aqui um “simplex” pudesse fazer sentido vir a ser ponderado!

 

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