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Gastos de Financiamento Líquidos e Estrutura de Capital – parte 2

No artigo publicado em 28 de janeiro abordou-se os efeitos do regime dos gastos de financiamento líquidos, sob a perspetiva do respetivo impacto na estrutura de capital das empresas.

Em resumo, mediante análise econométrica “difference-in-differences”, conclui-se que, após a introdução deste regime, as empresas impactadas (“grupo de tratamento”) reduziram o seu endividamento financeiro e endividamento total, respetivamente, em mais 4,4 e 5,9 pontos percentuais do que as empresas não impactadas (“grupo de controlo”). Este efeito foi aferido com referência aos anos de 2013 a 2017, incluindo, assim, o primeiro ano após o período de adaptação dos patamares do regime.

 

Da caracterização do universo de empresas impactadas (o dito grupo de tratamento) sobressaem outros aspetos de interesse quanto ao conhecimento dos efeitos do regime e que estarão, segundo se entende, em oposição à perceção prevalente sobre o tema.

 

Primeiramente, as empresas impactadas pela introdução do regime – consideradas, no caso, as que pelos dados financeiros de 2010-2012 apurariam gastos de financiamento líquidos excessivos –apresentam uma proporção entre estes gastos e o EBITDA contabilístico substancialmente inferior a 30%, especificamente 20,4%. Esta é uma evidência de que a adaptação do conceito de EBITDA para efeitos do regime é uma barreira efetiva à dedução de gastos de financiamento líquidos. Pode efetuar-se uma leitura complementar deste aspeto mediante a inversão do rácio, o que configura uma variante do “interest coverage ratio”, indicador frequentemente utilizado na avaliação da robustez financeira das empresas. Este “interest coverage ratio” ajustado é nas empresas impactadas de 4,9, o que parece sugerir que o alcance do regime dos gastos de financiamento líquidos não se encontra circunscrito a empresas com “endividamento excessivo”, uma das premissas invocadas para a sua criação em 2013. Para apuramento destes valores não se consideraram entidades não sujeitas ou isentas do IRC, ou em que se estime uma situação de prejuízo fiscal, em benefício de uma análise focada nas empresas materialmente impactadas pelo regime.

 

Um outro aspeto a salientar é o padrão de recapitalização das empresas com gastos de financiamento líquidos excessivos, especificamente, o facto de apenas 16% das empresas da amostra terem beneficiado de aumentos de capital social entre o início do regime e o primeiro ano após o período de adaptação (2017). Do mesmo modo, os dados não corroboraram a ideia prevalente de que a reversão de gastos de financiamento líquidos excessivos tenha sido efetuada com recurso relevante a aumentos de capital em espécie mediante a entrega de créditos de sócios. Com efeito, a redução do passivo que pode ser atribuída a este tipo de aumentos de capital é, no máximo, de 6.3% da redução total.

 

Numa leitura mais geral, sobressai que os aumentos de capital social, tanto em numerário como em espécie, tiveram um papel relativamente diminuto na redução do endividamento (proporção relativa do ativo financiada por passivo) destas empresas. Pode assim questionar-se se fará sentido que o incentivo fiscal da remuneração convencional do capital social mantenha condições restritivas para empresas com gastos de financiamento líquidos excessivos, a saber, a redução do patamar do EBITDA de 30% para 25%. Sendo o aumento de capital social o meio mais sólido de recapitalização de empresas, por maioria de razão, não deveria este incentivo fiscal distinguir negativamente empresas com gastos de financiamento líquidos excessivos, ou seja, empresas com maior endividamento. Aproxima-se uma boa oportunidade para retificação deste aspeto, no caso a perspetivada criação a nível europeu do DEBRA (Debt-Equity Bias Reduction Allowance) e a, consequente, reformulação do regime fiscal relativo à remuneração convencional do capital social em Portugal.

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