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Gastos de financiamento e legislação anti-híbridos

Na senda da ATAD II (“Anti Tax Avoidance Directive”), diretiva europeia que estabelece regras contra práticas de elisão fiscal, foi transposto para a legislação portuguesa um regime de limitação da dedução de gastos resultantes de pagamentos transfronteiriços em situações qualificáveis como assimetrias híbridas, concretamente quando tais pagamentos originem uma dupla dedução de gastos ou ainda uma dedução de gastos sem inclusão (“tributação”). Embora a norma se aplique a pagamentos de qualquer natureza, é expectável que tenha especial relevância quanto aos financiamentos transfronteiriços e respetivos juros.

As assimetrias híbridas poderão resultar, essencialmente, de diferentes qualificações entre jurisdições (i) quanto ao instrumento – v.g., um financiamento com características suscetíveis de ser classificado enquanto passivo na jurisdição do pagamento e capital na jurisdição do beneficiário – ou (ii) quanto ao tratamento das contrapartes enquanto ente fiscal ou não – v.g., uma entidade que, ao abrigo da lei da sua jurisdição, imputa os rendimentos aos seus detentores (“transparente”), mas que na perspetiva dos detentores não é transparente. Regra geral, são relevantes as assimetrias híbridas resultantes de relações entre entidades associadas, ou seja, quando exista uma participação de, pelo menos, 25% ou, em alguns casos, 50%. No cálculo desta percentagem incluem-se as participações detidas por entidades que “atuem conjuntamente”, o que expande significativamente o âmbito de aplicação da norma.

A ATAD II, tendencialmente, impõe a neutralização da assimetria por via da não dedução dos gastos na esfera do pagador, pelo que impende sobre os sujeitos passivos que sejam pagadores de fluxos transfronteiriços um novo paradigma quanto à avaliação da dedutibilidade de um gasto. Com efeito, enquanto outras normas de dedução de gastos dependem de elementos do próprio sujeito passivo (por exemplo, o artigo 23.º do Código do IRC), as disposições da ATAD II requerem a avaliação holística dos termos da operação subjacente ao pagamento, bem como o conhecimento do tratamento fiscal dos rendimentos na jurisdição da contraparte e dos atributos fiscais desta entidade, ou, no limite, ao longo da estrutura e em cada uma das jurisdições relevantes.

Devida nota deve ser feita ao alcance amplo destas normas, que, ao abrigo dos designados “híbridos importados”, pode gerar a um sujeito passivo em Portugal a obrigação de neutralizar uma assimetria híbrida (i.e., de acrescer o gasto), ainda que esta assimetria não exista na relação direta com a sua contraparte, mas sim a jusante.

Como resulta do exposto, a destrinça entre gastos dedutíveis e não dedutíveis em sede da ATAD II cabe ao sujeito passivo, pelo que surge a necessidade de constituir um processo documental consistente para sustentação dos respetivos quantitativos. Este aspeto deveria, recomendavelmente, ser regulado nas normas de constituição do dossier fiscal, dada a vastidão e complexidade da informação que, em última instância, poderá ser requerida para sustentar a não aplicação da ATAD II a determinada situação concreta.

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