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Ajudas de custo: Natureza remuneratória ou compensatória?

Nos últimos anos, têm sido inúmeros os casos em que Autoridade Tributária, em sede de inspeção, procede a correções no que concerne à tributação das ajudas de custo, nomeadamente por assumir que as mesmas constituem vantagem económica para os trabalhadores.

O conceito de ajudas de custo não se encontra definido no Código do IRS, nem propriamente na legislação laboral. No entanto, do Código do IRS consta uma delimitação negativa de incidência, prevista na alínea d) do n.º 3 do artigo 2.º e no Código do Trabalho, no artigo 260.º, uma exclusão do conceito de retribuição daquelas verbas. Adicionalmente,  existem vários acórdãos que clarificam este conceito determinando de uma forma geral que “A característica essencial das ajudas de custo é o seu caráter compensatório, visando reembolsar o trabalhador pelas despesas que suportou a favor da sua entidade patronal, por motivo de deslocações ao serviço desta, e a inexistência de qualquer correspetividade entre a sua perceção e a prestação do trabalho”, conforme se pode ler em acórdãos recentemente publicados do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCAS), no âmbito dos processos 14.14.3BEALM, 61/07.1BELRS, 623/13.8BEALM, 79/06.1BESNT, 583/13.5BEALM.

Assim, as importâncias recebidas a título de ajudas de custo revestem natureza compensatória, enquanto se limitarem a compensar o trabalhador por despesas efetivamente incorridas a favor da entidade patronal, não devendo constituir rendimento do trabalhador. No entanto, quando estas excedam os limites legais ou quando não se verificarem os pressupostos de atribuição aos servidores do Estado, constituem rendimento tributável na esfera do trabalhador, nomeadamente como rendimento do trabalho dependente, conforme decorre do disposto na alínea d) do nº 3 do artigo 2º do Código do IRS.

Já no que se refere aos limites quantitativos e qualitativos na atribuição das ajudas de custo, os mesmos encontram-se regulados por regime próprio aplicável às deslocações em território nacional ao e no estrangeiro. No entanto, não está previsto, na legislação atualmente em vigor, um limite temporal para a atribuição de ajudas de custo para deslocações ao e no estrangeiro, contrariamente ao que se verifica para deslocações em território nacional. De facto, relativamente a estas está estabelecido um limite, de atribuição de ajudas de custo, de 90 dias seguidos de deslocação, o qual pode ser prorrogado por igual período (ou por período superior em algumas situações). Não obstante, esta é uma matéria relativamente à qual não existe um entendimento uniforme.

De realçar que o conceito de ajudas de custo tem sempre subjacente uma situação temporária de deslocação do domicílio necessário (conforme definido no Decreto Lei n.º 106/98, de 24 de abril de 1998), pelo que existe sempre o risco de se entender que não estamos perante a atribuição de uma ajuda de custo, se a deslocação for percecionada como uma mudança efetiva do local de domicílio necessário.

Por outro lado, a atribuição regular de ajudas de custo apresenta risco de as quantias passarem a constituir natureza remuneratória. A este propósito, poderá verificar-se no âmbito de alguns acórdãos do TCAS (como por exemplo, no âmbito do processo 766/13.8BEALM de 30 de setembro de 2020 e 2942/12.1BELRS de 11 de novembro de 2021) que as quantias recebidas a título de “ajudas de custo” foram consideradas como remuneração em contrapartida do trabalho pelo seu método de atribuição, nomeadamente por serem atribuídas de forma diária e regular, o que constituía indicador, para a Autoridade Tributária, de que as quantias eram atribuídas para compensar o trabalhador por se dispor em trabalhar no estrangeiro, em vez de compensar os seus custos (viagem, estadia, alimentação) por estar deslocado no estrangeiro.

Ora, esta é uma área que a Autoridade Tributária tem vindo, frequentemente, a questionar em sede de inspeção, propondo correções ao tratamento fiscal das ajudas de custo, sendo que muitas vezes, em fase de impugnação, acabam por tais correções não prevalecer por falta de prova. Pois, neste caso, e como têm concluído os tribunais, é sobre a Autoridade Tributária que recai o ónus da comprovação da falta dos pressupostos da sua atribuição.

Em suma, apesar de a jurisprudência conhecida até ao momento ser tendencialmente favorável aos contribuintes, importa chamar a atenção que deverão ser considerados os seguintes pressupostos para que as ajudas de custo não sejam tributadas em sede de IRS: (i) os montantes serem auferidos enquanto ajudas de custo por realização de uma efetiva deslocação por parte do trabalhador ao serviço e no interesse da sua entidade patronal; (ii) que o trabalhador esteja deslocado ou faça deslocações relativamente ao seu local de trabalho normal; (iii) que, por força dessa deslocação, incorra em despesas; e (iv) que o pagamento de quantitativo diário não exceder os limites anualmente fixados para os servidores do Estado.

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