Estamos a presenciar um crescente domínio da era virtual, caracterizada pelo acesso facilitado a uma ampla gama de serviços que estão apenas a um clique de distância, nomeadamente conferências, exposições e até concertos online.
Embora muitos ainda prefiram serviços in locco, a transição para o virtual não só levou as empresas a reavaliarem os seus modelos de negócio, como também suscitou reflexões por parte das autoridades fiscais sobre o correcto enquadramento de certas prestações de serviços nos termos das regras do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).
No recente processo 532/22 do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), o mesmo foi chamado a pronunciar-se sobre os conceitos de prestação de serviços relacionados com o acesso a manifestações recreativas.
O processo opunha as Autoridades Fiscais Romenas e a Westside Unicat, entidade com sede na Roménia, que explorava um estúdio de gravação de vídeos. A sua principal atividade económica consistia em comercializar junto da StreamRay USA Inc (pessoa colectiva registada nos Estados Unidos) conteúdos digitais na forma de sessões de comunicação visual e presencial (vídeo-chats). Por sua vez, a StreamRay era a responsável pela difusão em direto, no seu site, dos vídeos dessas sessões e pela disponibilização aos seus clientes – pessoas singulares – de todas as interfaces necessárias para usufruirem do serviço em causa.
Se por um lado o sujeito passivo qualificou as suas prestações de serviço como sendo enquadradas na regra geral (e por isso não sujeitas a IVA na Roménia), por outro, a Autoridade Tributária entendeu que o sujeito passivo era o organizador do espetáculo interativo em causa, qualificando como manifestações recreativas na aceção do artigo 53.º da Diretiva 2006/112/CE e, por isso, sujeitas a IVA na Roménia.
Neste sentido, o TJUE, foi chamado a pronunciar-se sobre a interpretação do artigo 53.º da Diretiva 2006/112 com o objectivo de avaliar se o mesmo se aplica aos serviços fornecidos pelo estúdio de vídeo-chat ao gestor do sítio web, os quais envolvem sessões interativas, filmadas e transmitidas em directo.
Ao abrigo da Diretiva 2006/112/CE o lugar das prestações de serviços relativos ao acesso a manifestações recreativas e de serviços acessórios relacionados com o acesso, efectuadas a sujeitos passivos, é o lugar onde essas manifestações se realizam efectivamente.
O Tribunal reitera, através de jurisprudência anterior, que este artigo é de interpretação restrita, referindo ainda que as sessões de vídeo interativas constituem atividades recreativas, uma vez que têm por objetivo proporcionar aos seus destinatários uma fonte de recreação não se limitando o conceito de actividades recreativas às prestações de serviços efetuadas na presença física dos destinatários desta atividade.
No entanto, em contrapartida, o conceito de manifestação designa uma apresentação ao público e, por isso, vem referir o Tribunal que o acesso a uma manifestação deve ser entendido no sentido em que inclui prestações de serviços que intervêm a jusante da organização mas que visam concender o acesso do público a esta última.
Faz ainda referência ao Regulamento de Execução nº 282/2011 para precisar que os serviços acessórios a que se refere o artigo 53.º incluem serviços que estejam diretamente relacionados com o acesso a manifestações, prestados separadamente a título oneroso à pessoa que assiste a uma manifestação. Resulta portanto daqui, a regra que o artigo 53º deve ser entendido no sentido em que se aplica não aos serviços prestados para realizar uma atividade que dá lugar a uma manifestação, mas apenas às prestações relativas à comercialização, junto dos clientes, do direito de acesso a tal manifestação.
Por fim, conclui o Tribunal que as prestações de serviço efetuadas por um estúdio de gravação de video-chats a favor do gestor de uma plataforma de difusão, através da internet, e que consistem em realizar conteúdos digitais na forma de sessões de video interativo filmadas por este estúdio para os colocar à disposição deste gestor para efeitos de difusão na referida plataforma, não qualificam como prestações de serviço que têm por objeto conceder aos clientes o direito de acesso a esses conteúdos.