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A segurança jurídica dos regimes especiais

Recentemente reabriu-se a polémica à volta dos regimes dos residentes não habituais e dos vistos Gold. Portugal também tem a Comissão Europeia a rever o regime fiscal da Zona Franca da Madeira (ZFM) no âmbito de um procedimento por auxílios de Estado ilegais que, se correr mal, provavelmente a atingirá de forma letal.

Poderíamos pensar que a existência destes regimes é uma invenção portuguesa, mas a verdade é que eles proliferam por toda a União Europeia. E têm um objetivo claro: permitir alguma vantagem competitiva que equilibre os pratos da balança no caso de países ou territórios que, por razões naturais ou conjunturais, são normalmente preteridos nas decisões de investimento que possibilitam a captação de capitais, a criação de emprego e, por fim, direta ou indiretamente, o aumento da receita fiscal. Quando um país que conseguiu implementar um desses regimes o perde, imediatamente outro país recebe todo o investimento perdido.

E a existência destes regimes faz perder alguma receita fiscal ou de natureza semelhante? Obviamente que não. Se não existirem vistos Gold em Portugal, os candidatos escolherão Espanha, Chipre ou a Irlanda. O mesmo se aplicará no caso dos residentes não-habituais ou se se permitir que o regime da ZFM seja ainda mais fragilizado. Não se gera qualquer receita adicional. Na verdade, evaporam-se empregos, depósitos bancários e outras aplicações no nosso sistema financeiro e reduz-se a atividade imobiliária. Tudo efeitos negativos. Aliás, a existência destes regimes especiais induzem receitas adicionais que de outra forma não existiriam.  Ou seja, estaremos sempre a trocar alguma coisa por nada.

Será que Portugal se pode dar ao luxo de alterar ou mesmo terminar estes regimes antes do tempo? A resposta, do ponto de vista do bom senso, só pode ser negativa. O nosso país continua a ter um problema sério de credibilidade internacional por causa da falta de segurança jurídica e de estabilidade fiscal para os investidores estrangeiros. Quando se lança um regime direcionado a não residentes, que assenta numa perspetiva de estabilidade, tem que existir um consenso sério que o mesmo terá que ser mantido, pelo menos pelo prazo previsto no momento em que foi lançado. De outra forma, é melhor estarmos quietos. Só a possibilidade, que até pode nunca se concretizar, de tais regimes poderem ser alterados ou revogados, quando é mencionada por responsáveis políticos credíveis, gera efeitos irreparáveis e bastante adversos.

E a pergunta é: se os resultados destes avanços e recuos são tão nocivos, porque é que continuam a acontecer? Não se tratará de um mistério propriamente dito. E será também porventura excessivo acusar os que os promovem de falta de bom senso. Mas talvez não andaremos muito longe da verdade se apontarmos para calculismos políticos de circunstância e de vistas curtas que, por muito bem que pareçam momentaneamente a certas franjas da população, são verdadeiramente nocivos para o país como um todo.

Não se pretende defender neste texto a existência de sistemas distorcivos da concorrência, que encoragem negócios ilegais, fuga aos impostos ou a entrada no nosso teritório de criminosos. Nada disso. O processo de autorizações e de monitorização deve ser o mais rigoroso possível. O desleixo a este nível será fatal para  a capacidade futura para defender a existência destes regimes num modelo de concorrência não distorciva. E, se falharmos nesta parte tão importante, só nos poderemos queixar de nós próprios.

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