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A relação entre a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) e os sujeitos passivos de IVA não residentes: É complicada

O Ofício-Circulado n.º 30235/2021, de 27 de abril (OC n.º 30235), destaca-se por ter os sujeitos passivos de IVA não residentes como seu tema principal. Contudo, e contrariamente ao que era esperado, permanecem muitas mais questões do que respostas após a divulgação destas instruções por parte da AT.

Como chegámos aqui? Em 2019, a AT abalou os alicerces do enquadramento dos sujeitos passivos não residentes com a divulgação do seu Ofício-Circulado n.º 30213/2019, de 1 de outubro (OC n.º 30213), que, embora versasse sobre o processamento de faturas e outros documentos fiscalmente relevantes, determinava que o Ofício-Circulado n.º 30073/2005, de 24 de março (OC n.º 30073) - que por sua vez versava sobre reembolsos de IVA a sujeitos passivos não residentes - se encontrava tacitamente revogado, prevendo para breve a divulgação de novas instruções sobre a matéria.

Uma das conclusões essenciais do OC n.º 30073 era de que, não obstante a inexistência de sede, estabelecimento estável ou domicílio, os sujeitos passivos não residentes estavam sujeitos ao cumprimento das obrigações do Código do IVA (CIVA), designadamente as de liquidação e pagamento do imposto devido pelas operações realizadas no território nacional, ficando esvaziada de conteúdo a norma de incidência subjetiva contida na alínea g) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA (que coloca a obrigação de liquidação e entrega do imposto ao Estado na esfera do sujeito passivo residente, quando este adquira bens ou serviços a um sujeito passivo não residente).

Com base nestas instruções, os sujeitos passivos não residentes liquidavam imposto - emitindo faturas dentro dos trâmites legais e através dos seus Números de Identificação Fiscal (NIF) - nas suas operações internas, ainda que os adquirentes fossem sujeitos passivos de IVA estabelecidos em território nacional.

Como seria de esperar, a revogação tácita - e também discreta, em nota de rodapé - do OC n.º 30073 pelo OC n.º 30213 gerou logo uma grande incerteza entre os sujeitos passivos não residentes, tendo em conta que seria necessário aguardar por novas instruções para se saber qual o enquadramento a aplicar, na opinião da AT, às operações realizadas em território nacional.

Quase 19 meses depois, a AT divulgou o muito esperado OC n.º 30235, que visava esclarecer o conjunto de direitos e obrigações, em sede de IVA, que impendem sobre os sujeitos passivos não residentes no território nacional e que aqui realizem transmissões de bens e prestações de serviços.

Infelizmente, permanece praticamente toda a incerteza criada com o OC n.º 30213. Resumidamente, no OC n.º 30235 a AT limita-se a afirmar que os sujeitos passivos não residentes que apenas efetuem operações abrangidas pelas regras de inversão previstas nas alíneas e), g) e h) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA, não deverão possuir um registo para efeitos de IVA no território nacional, sendo este apenas necessário para a realização de operações tributáveis pelas quais sejam considerados devedores do imposto.

Uma vez que o OC n.º 30235 apenas refere os sujeitos passivos não residentes que praticam exclusivamente operações abrangidas pelas regras de inversão previstas no n.º 1 do artigo 2.º do CIVA e não dá qualquer indicação relativamente ao tipo de operações que cria a obrigação de registo, a maioria dos sujeitos passivos não residentes acaba por ficar sem saber qual o enquadramento a aplicar às suas operações em sede de IVA.

Das diversas questões que ficam por responder, pode-se dar apenas os seguintes exemplos: Qual o enquadramento que deve ser aplicado às transmissões internas sujeitas à alínea g) do n.º 1 do artigo 2.º do CIVA quando o sujeito passivo não residente pratica outras operações (transmissões intracomunitárias de bens, por exemplo) em território nacional, para as quais é necessário um registo? Estas operações devem constar de uma fatura emitida pelo seu NIF português? Em caso afirmativo, de que forma é que estas operações devem ser reportadas na declaração periódica de IVA?

Afirmar que o OC n.º 30235 peca por escasso é um eufemismo. Urge clarificar esta temática o quanto antes para que os sujeitos passivos não residentes possam obter o mínimo de segurança e de certeza no exercício dos seus negócios no nosso país.

Até lá, a relação entre a AT e estas entidades vai estar forçosamente marcada pela dúvida e pela obscuridade.

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