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A dedutibilidade dos juros no momento pós-fusão (inversa)

A dedutibilidade dos juros é um dos temas mais relevantes no contexto das operações de reorganização societária, o qual tem sido objeto de grandes discussões, quer no Supremo Tribunal Administrativo quer no Tribunal Arbitral (“CAAD”).

Relativamente a este tema, importa salientar que a concretização de fusões inversas – operações no âmbito das quais existe uma transferência do património da sociedade fundida para a sociedade beneficiária, quando a totalidade do capital social desta última seja detida pela sociedade fundida – têm contribuído (e muito) para estes litígios.

Nos últimos anos, a AT tem questionado a dedutibilidade, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”), dos juros suportados com a aquisição de empresas, quando a sociedade adquirente é fundida na adquirida. Entende a AT que os juros não são dedutíveis nos termos do artigo 23.º do Código do IRC, porquanto:

  • não merecem a qualificação de “indispensáveis” para a obtenção dos proveitos ou manutenção da fonte produtora; ou,
  • não contribuem para a realização ou manutenção de rendimentos sujeitos a imposto pois, após a fusão, já não têm como propósito financiar a aquisições de participações, não sendo, por isso, aplicados na exploração.

No entanto, e em sentido oposto, podemos constatar que várias decisões do CAAD têm vindo a sustentar que a dedutibilidade dos referidos gastos não pode ser avaliada nos moldes acima, tendo, em consequência decidido a favor dos contribuintes (i.e. no sentido de garantir a dedutibilidade fiscal de tais gastos financeiros).

Isto porque (i) a operação de fusão descrita no direito comercial – seja invertida ou não – merece o mesmo tratamento e regime para o direito fiscal, (ii) não se pode alegar que há um desvio do financiamento com um intuito abusivo, quando existe uma transferência de todos os direitos e obrigações para a sociedade incorporante que irá prosseguir a atividade da incorporada, (iii) o momento temporal para aferir a dedutibilidade é determinado pelo momento em que são gerados – logo, se estes juros eram dedutíveis na ausência da fusão, não podem deixar se o ser na sequência desta operação e, ainda, (iv) o referido artigo 23.º do Código do IRC não se reconduz a uma norma anti-abuso, pelo que não pode ser utilizada em substituição de outros artigos.

Ora, se dúvidas não existem quanto ao entendimento que o CAAD tem vindo a defender no que respeita à dedutibilidade dos juros no momento pós-fusão nos termos deste artigo, o mesmo não se aplica quanto à dedutibilidade desses mesmos juros num cenário de aplicação da norma geral anti-abuso.

A este respeito, importa salientar que, de um modo geral, o CAAD marcou a sua posição referindo que os Árbitros não se podem pronunciar sobre a natureza/motivação económica vs fiscal destas operações de fusão quando a própria AT propõe que a correção seja efetuada ao abrigo do artigo 23.º e não dos artigos 63.º ou 73.º do Código do IRC ou do artigo 38.º da Lei Geral Tributária. Assim, e mesmo que se “desconfie” do encadeamento temporal e cronológico das operações e da “poupança fiscal” assegurada na sequência destas operações, o CAAD não pode negar a dedutibilidade de tais juros com base na argumentação proposta pela AT.

Significa isto que, para o CAAD, é evidente que não pode ser exigido um nexo de causalidade entre os gastos de juros e os rendimentos da empresa, mas não é claro que a operação de fusão inversa nos moldes acima não possa ser considerada abusiva e, consequentemente, os gastos serem considerados não dedutíveis, nomeadamente, nos termos do artigo 38.º da LGT.

Assim, e num contexto de alinhamento com o BEPS (“Base Erosion and Profit Shifting”), nomeadamente por via da transposição da ATAD (“Anti Tax Avoidance Directive”) 1 e 2 para o nosso ordenamento jurídico – a qual alterou e reforçou as normas anti-abuso previstas na legislação fiscal, nomeadamente para as operações transfronteiriças –, deverá avaliar-se em que medida é que, no futuro, a dedutibilidade fiscal dos juros nestas operações poderá ficar ainda mais condicionada.

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